Na BH de 1917, cirurgias redefiniram gnero de pacientes at contra vontade – Gerais

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 Jornais tratavam interven
Jornais tratavam intervenes porquê cirurgia de mudana de sexo e chamavam a ateno para alteraes de nome e padro de comportamento (foto: Fotos: Juarez Rodrigues/EM/D.a press/Reproduo )
O caso “Emlia-David”, episdio em que uma cirurgia na Belo Horizonte de 1917 definiu a redesignao de gnero de um rapaz com malformao genital criado porquê moça at os 19 anos, no foi o nico a lucrar as pginas dos jornais no comeo do sculo pretérito porquê operao de “mudana de sexo”. Uma expresso tecnicamente equivocada, j que se referia a diagnsticos de pseudo-hermafroditismo ou “hipospdia” – condio em que rgos genitais masculinos apresentam semelhana malcriada com a anatomia feminina, oferecido o pequeno desenvolvimento do pnis, que lembra vagamente um clitris hipertrofiado.
At a dcada de 1930, houve em BH registro de ocorrncia de mais 20 casos semelhantes histria de Emlia Soares (1898-1951), de 19 anos, que se submeteu a uma cirurgia e se tornou David Soares, com mudana na ento carteira de idade (hoje de identidade). Operado, David se casaria com uma antiga colega de turma do colgio feminino e passaria a trabalhar porquê funcionrio pblico. Porquê ele, a maioria dos outros pacientes esteve sob os cuidados do mdico David Corra Rabello (1885-1939) no Hospital So Vicente de Paulo, atual Hospital das Clnicas, em Belo Horizonte.

Naturais do interno de Minas, muitas pessoas que passaram pelo bisturi do doutor Rabello ficaram conhecidas, maldosamente, porquê “Mrio-Maria” ou “Maria-Mrio”. O Estado de Minas localizou famlias com antepassado nessa condio, mas, “por uma questo de reverência memria do parente”, algumas pessoas preferiram no dar entrevista. Assim, determinados nomes sero omitidos nesta terceira reportagem da srie “Vidas em transio – De Emlia a David”.

SOB O ARCO-RIS

 

Em 28 de janeiro de 1933, o EM mostrava a histria de uma mulher de 20 anos, que na poca morava havia pouco mais de 12 meses em BH. Submetida a uma cirurgia para retirada do apndice, “levantou-se transformada em robusto rapaz”. Eis um trecho da reportagem, intitulada “O resultado surpreendente de uma corriqueiro operao de apendicite”.
“A moa que se deitara na mesa operatria, sob os cuidados do dr. David Rabello, levantou-se transformada em robusto rapaz. A histria pitoresca de um menino que foi criado por seus pais porquê se pertencesse ao sexo feminino. Uma mito antiga culpa o círculo-ris de certas metamorfoses humanas. Diz a superstio popular que o varão que passa sob o círculo-ris transforma-se em mulher. E reciprocamente”, dizia o texto da poca.
Prosseguiu o reprter: “No planalto em que foi plantada Belo Horizonte, o círculo-ris um caso vasqueiro. Entretanto, o orientação parece ter escolhido a capital mineira para palco de suas mais extravagantes e irnicas experincias. A populao guarda memria de uma senhorita que, subitamente, com o auxlio de espargido cirurgio, transformou-se em varonilssimo mancebo, hoje casado e réplica pai de famlia.”
No seu recente trabalho “Miloca que virou David – Intersexualidade em Belo Horizonte (1917-1939)”, o redactor, pesquisador e professor Luiz Morando revela a frequncia de registro, nos textos jornalsticos de ento, “de claro processo de mudança, ocupação irnico e censurável do prefixo ‘ex’” e um contraste entre os termos “gentil senhorita” e a figura possante do Davi bblico. “Na pequena capital mineira de ento, David Soares encarnava o mito do indivduo que, ao passar sob o círculo-ris, tinha seu sexo trocado, confrontando a rigidez biolgica e cientfica do binarismo sexual”, escreveu o responsável.

Maioria dos pacientes tinha origem humilde


Luiz Morando labareda a ateno para a origem social humilde da maioria das pessoas afetadas pela repentina mudana de gnero a partir da cirurgia de desambiguao de sexo, entre elas uma pessoa da zona rústico de Curvelo, na Regio Mediano de Minas. A exemplo de outras pessoas, era chamada de “mulher-varão”, e no sabia explicar por que, “possuindo mal-parecido masculina, voz aguda, msculos desenvolvidos, um buo sombreando-lhe o lbio superior”, fora criada porquê pertencente ao sexo feminino.
Em fevereiro de 1934, o poeta Djalma Andrade narrava outras aes do doutor Rabello, no extinto Dirio da Tarde: “Ser ou no ser... A questo/pode trazer confuso/Toda a incerteza de Hamlet.../Somente o fero escalpelo/do doutor David Rabello/Inspira confiana e f”.
Dois meses depois, a maioria dos jornais “ocultou” a cirurgia de jovem do interno de Minas, da famlia de um prefeito. Em junho, foi a vez de a servente de uma escola de Santa Luzia, na Regio Metropolitana de Belo Horizonte, subordinar-se ao “bisturi milagroso” de Rabello e “passar a ser um autntico varão”.
O relato est em matria do Estado de Minas de 7 de junho de 1934: “Aps queixar-se de fortes dores no abdmen diretora, essa examinou a funcionria, pensando tratar-se de apendicite, e constatou o ‘fenmeno’”. A matria diz que, aps a cirurgia, a dcima do tipo realizada pelo doutor Rabello, o paciente foi muito visitado por diversos curiosos da capital e da cidade vizinha.
Maior parte das interven
Maior secção das intervenes foi feita pelo pioneiro mdico David Corra Rabello (1885-1939) no Hospital So Vicente de Paulo, atual Hospital das Clnicas, em Belo Horizonte (foto: Registo Pblico Mineiro/Reproduo)

Ela no queria, mas foi operada


Em Lagoa Santa, tambm na Grande BH, em setembro de 1938, ganhou destaque o caso emblemtico de empregada domstica de 27 anos, tambm com diagnstico de malformao. Conforme reportagem do EM, ela declarava que queria continuar vivendo porquê mulher. Trazida a BH, foi claro de um debate sobre a convenincia de uma cirurgia contra a sua vontade, e se posicionou: “Se for para virar varão, no me deixarei operar”. Mesmo sob  protestos, a deciso da paciente no foi respeitada: o pai autorizou a cirurgia em 4 de setembro de 1938.
“Essas histrias culminam com as ideias centrais que as narrativas apresentadas contm: emendar um (suposto) erro da natureza, restabelecer uma (suposta) verdade, menosprezar a vontade do (a) paciente”, ressalta o pesquisador Luiz Morando. Em sua avaliao, o caso de Lagoa Santa emblemtico sob vrios aspectos: “O lugar do paciente face ao varão da lei (no caso, o mdico); o conflito de interesses a ser resolvido, sempre pênsil para o lado da domínio mdica ou paterna; o exposição do masculino marcando a diferena de gneros e hierarquizando-os; o foco distorcido sobre a monstruosidade – para os mdicos, necessrio emendar a natureza para a paciente deixar de ser monstro; para a paciente, ela passa a ser monstro ao ter ‘revisto’ seu corpo, no se conformando com o ‘malfeito’”.

RECUSA

 

Em fevereiro de 1939, uma lavadeira do Grande Hotel de Belo Horizonte, identificada porquê varão ao fazer um inspecção para obter a carteira de sade, tambm se recusou a fazer a cirurgia. Coincidentemente, uma de suas irms havia sido considerada “mulher-varão” e operada. Curioso que a divulgao do caso da lavadeira ocorreu uma semana aps a morte, em 10 de fevereiro de 1939, do mdico David Rabello, que, apesar das controvrsias, tornou-se cirurgio respeitadssimo, teve seus mritos cientficos reconhecidos e se tornou patrono da cadeira de nmero 62 da Ateneu Mineira de Medicina. 

Vidas em transio  Ontem: Mdico que fez 1ª interveno para desambiguao de sexo em BH deixou seu nome marcado na histria 
Amanh: No tnel do tempo – Porquê eram BH e o mundo na poca em que Emlia se tornou David


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