Olhos azuis

Apareceu na televisão, e depois no jornal, o depoimento de um cidadão que estava perto do acidente de Eduardo Campos. O homem, com lágrimas nos olhos, dizia ter visto uma bola de fogo –a queda do jatinho –os corpos espalhados no chão. Aproximou-se de um corpo. Abriu as pálpebras do morto: os olhos eram azuis. “Era o meu candidato…”, disse para as câmeras, forçando o choro.
O problema é que a identificação dos corpos não poderá ser feita nem mesmo pelo exame das arcadas dentárias, segundo a perícia.
A “testemunha” simplesmente delirava.
Qual será o impulso de alguém para mentir sem levar nenhuma vantagem com isso? Queria só aparecer na televisão? Não acho muito plausível. Talvez a vontade não seja exatamente de mentir; é a vontade de ver se o outro acredita. O homem buscava, no repórter que o entrevistou, um olhar que expressasse, digamos, uma “ausência de desconfiança”.
“Acreditam em mim!” Esse é o maior prazer do mentiroso; procura, no fundo, acolhimento.
Não por acaso fixou-se no detalhe dos olhos azuis. Nada disso é quantificável, acho, mas o fato de Eduardo Campos ter olhos azuis também contribuiu para sua popularidade. Talvez para nós, brasileiros, nos pareçam “verdadeiros”, “sinceros” os olhos claros.
O cidadão que “testemunhou” o acidente queria que acreditassem nele –nada melhor do que olhos azuis para dar veracidade a seu depoimento. [email protected]

Fonte: Marcelo Coelho